Uma das bandas mais teenager da década mudou, no ano passado, a sua orientação sonora. Esta mudança de som provocou o gáudio de uns e a desilusão de outros. Humbug dos Arctic Monkeys é o álbum no qual a banda parece caminhar a passos largos para a maturidade.
A história começa a escrever-se quando o quarteto de Sheffield convida Josh Homme [para alguns, o grande "rockeiro" dos últimos 15 anos] para co-produzir o álbum. Escusado seria dizer que foi exigido aos Arctic Monkeys que voassem para os E.U.A. Mais propriamente para Mojave Desert, um deserto nas redondezas de Nova Iorque. É no habitat natural do ex-guitarrista dos Kyuss que se desenrola a escrita e gravação de alguns temas de Humbug. Entretanto os Arctic Monkeys lançaram o single "Crying Lightning" [que já tinha alguma rodagem ao vivo], a 6 de Julho passado, que, para quem não se tinha apercebido do que se passava na banda de Alex Turner e companhia, foi um choque. "Onde foi parar a jovialidade e energia dos Arctic Monkeys?" - perguntavam os mais inconformados. Já em Agosto, sai para as lojas Humbug, que vem provar que "Crying Lightning" era apenas a ponta do iceberg.
O crescimento dos Arctic Monkeys está à vista de todos, até dos mais cépticos em relação ao novo álbum da banda britânica. A mudança não se processa apenas no som, mas também na atitude da banda. Há poucos dias assisti a uma entrevista com estes quatro rapazes, na qual eles afirmavam não ser a mesma banda de "Teddy Picker" - um dos temas que afirmam que não voltarão a tocar ao vivo - e que esses tempos já faziam parte do passado. Não deixa de ser uma atitude corajosa cortar com o passado desta forma, um passado que afinal valeu aos Arctic Monkeys fãs pelo mundo fora e milhões de discos vendidos.
Opiniões pessoais aparte, há que reconhecer Humbug como o melhor trabalho dos Arctic Monkeys até hoje. O novo álbum traz participações tão ilustres como as de Alisson Mosshart e Josh Homme [não só a produzir o disco, juntamente com James Ford, mas também a emprestar a sua voz e riffs em algumas faixas]; traz uma série de boas influências como Cream e Jimi Hendrix, mas acima de tudo traz uma nova atitude.
Pelo mundo fora há quem não tenha gostado que as alegres e facilmente digeríveis "I Bet You Look Good On The Dancefloor", "Teddy Picker" e "When The Sun Goes Down" tenham dado lugar à densidade e negridão de "Pretty Visitors", "Potion Approaching" e "My Propeller", mas este era o caminho a seguir. A mudança de som acabaria por se dar à medida que os Arctic Monkeys fossem amadurecendo com músicos e como pessoas e há muito que se adivinhava. Afinal se há coisa que não falta ao quarteto de Sheffield é talento e Humbug é a maior prova disso mesmo.
André Beda Em 2001 foram os The Strokes a abrir as hostes do indie rock do novo século com Is This It, apelidado como "a salvação do rock", seguiram-se então os sucessos imediatos dos The Libertines, Franz Ferdinand, The Killers, Kaiser Chiefs e mais uma mão cheia de bandas. Mas é em 2006, com Whatever People Say I Am, That's What I'm Not, dos Arctic Monkeys, que o indie rock vindo das ilhas britânicas explode - excepção feita aos The Strokes que vêm dos E.U.A. -, e que se assume como um género mais mainstream, que passa a ser mais rentável e que se desliga finalmente do rótulo imposto no século XX.
Um pouco de história: até finais da última década do século XX, início do século XXI, uma banda era rotulada de "banda indie" quando a sua editora era independente, não pertencia a uma grande editora; hoje em dia "ser uma banda indie" é ter uma sonoridade indie - um género musical facilmente identificável.
Com o primeiro álbum os Arctic Monkeys tornam-se no maior grupo indie a nível mundial e, para além do enorme sucesso em vários tops mundiais, tornam-se numa das bandas mais jovens de sempre da história da música a obter tais façanhas. Pouco mais de um ano passou desde a sua estreia e a banda, oriunda de Sheffield, Inglaterra, edita o seu segundo álbum - Favourite Worst Nightmare, de 2007 - que se mostrou claramente como forma de rentabilizar ainda mais a carreira da banda liderada por Alex Turner. Sentiu-se nesse segundo trabalho um menor cuidado nas letras e até na sua música, algo que a imprensa musical não perdoou. No entanto, o público e os fãs da banda receberam o segundo álbum de braços abertos, o que permitiu a continuação do percurso ascendente do grupo.
Dois anos passaram e, no ano passado, os Arctic Monkeys voltam à carga com mais um novo álbum, desta vez com o seu terceiro de originais, Humbug, que logo à partida trazia uma grande novidade: Josh Homme, homem forte dos Queens Of The Stone Age, Eagles Of Death Metal e dos Them Crooked Vultures, aceitara o convite de produzir este novo álbum da banda com James Ford, este último que já tinha produzido Favourite Worst Nightmare. Advinhava-se aí uma mudança no som dos Arctic Monkeys e expectativas não faltaram.
E assim foi. No dia 30 de Julho a banda colocou no seu site um concerto propositadamente gravado para saciar a sede dos fãs. Nessa jogada de marketing a banda apresentou-se com uma estética lembrando os Doors, mas só 20 dias depois é que se poderia tirar conclusões.
Ao segundo álbum a banda já tinha imposto um negrume pouco usual na sua estreia, o que antevia que ao terceiro registo a exploração desse lado mais obscuro fosse um pouco mais profunda mas com Josh Homme tudo isso foi agravado. Após esse concerto online transmitido para todo o mundo, Humbug saiu para as lojas e notou-se perfeitamente que o contacto com Homme alterou a forma como a banda passa a ver as músicas: mais escuridão, recurso a pianos, o psicadelismo, a rigidez, a força do deserto... Tudo é diferente daquilo que tinham feito antes. Só a calmaria de "Secret Door" e de "Cornerstone" nos consegue fazer lembrar, por momentos, os novatos Arctic Monkeys de Whatever People Say... ou os sobrecarregados Arctic Monkeys de Favourite Worst Nightmare, mas mesmo assim as diferenças são claramente visíveis. [Pelo meio Alison Mosshart (The Kills e The Dead Weather) ainda dá uma perninha em "Fire And The Thud".]
Algumas pessoas sentiram-se "enganadas" com este terceiro trabalho, mas a realidade é esta: a banda britânica ganhou personalidade, deixou as borbulhas e ganhou pêlos na cara. Não seguiram, como a maioria das bandas de indie rock, a electrónica como recurso à inovação do seu próprio som e juntaram ao que já tinham muita cerveja, pujança e um sentido estético que as bandas stoner rock não conseguem incutir no seu som e apresentaram, assim, Humbug.
Ao terceiro álbum os Arctic Monkeys confirmaram, com muita inteligência, a sua posição no mundo da música. Eles são grandes!
Carlos Montês
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